sexta-feira, 1 de abril de 2016

12.6 - Bálcãs - Templo de São Sava

Para se compreender a importância do imenso templo construído no ponto mais alto de Belgrado, em honra a  São Sava é preciso conhecer a história da formação da Sérvia Medieval há mil anos atrás.

Vista frontal do templo dedicado a São Sava, em Belgrado.
Stefan Nemanja, fundou a Dinastia Nemanjic em 1166 e durante 30 anos articulou a fundação de um império sérvio. Tinha o estatuto de Príncipe do Império da Sérvia. Teve 3 filhos: Vukan, Stefan e Rastko
Consolidado o projeto político, abdica do trono em 1196 em favor de seu filho Stefan II (que se tornou o Primeiro Rei da Sérvia) e se torna monge com o nome de São Simão, permanecendo no mosteiro de Studenica por mais de um ano.
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Afresco de São Simão no Mosteiro Studenica, na Sérvia
Nesse meio tempo, seu filho mais novo, Rastko já se encontrava, desde 1192, no norte da Grécia, no Monte Athos, no mosteiro russo de São Pantaleão, onde adotou o nome religioso de Sava. No ano seguinte, Simão parte para o Monte Athos e, junto com seu filho, inicia gestões junto ao Patriarcado de Constantinopla para a restauração do Mosteiro de Hilandar, dedicado à formação dos monges sérvios no Monte Athos. Os recursos para tal obra vieram da corte sérvia.

É no Mosteiro de Hilandar que Sava consolida seu papel de líder espiritual, canônico, político e diplomático. Constrói cânones, negocia monastérios e arruma inimigos: os cristãos romanos de Monte Athos e Constantinopla, motivo pelo qual abandona o mosteiro em 1205, após 14 anos de permanência e parte para ser o abade de Studenica. Carrega consigo os restos mortais de seu pai e os deposita no Mosteiro de Studenica, onde permanece até hoje. Simão é canonizado como São Simão no ano seguinte.


Nessa volta à Sérvia, atua como mediador entre seus irmãos Stefan e Vukan, em guerra pela disputa do trono. Talvez seja esse seu papel mais importante na História da Sérvia: a manutenção da unidade política da dinastia Nemanjic, motivo pelo qual é o herói medieval mais importante da nação o que lhe garante o status de Patrono da Sérvia.

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Afresco de São Sava no Mosteiro de Studenica
Ai, a história da Sérvia não é simples. 
Enquanto permanece em Studenica, seu irmão e rei da Sérvia, Stefan II estreita relação com o a Igreja de Roma e - apoiado pelo Papa, é coroado por Roma como rei cristão. Sua Coroação acontece no Mosteiro de Zica, a 80 km de Studenica. Esta política externa e religiosa de Stefan II entra em conflito direto com Sava, naquele momento o mais importante líder religioso da Igreja Ortodoxa na Sérvia, provocando seu abandono de Studenica e seu retorno ao Monte Athos, em 1217.
Lá ele continua seu papel diplomático e constrói a independência da Igreja Ortodoxa Sérvia, em relação à Constantinopla ( lembrar que Constantinopla estava enfraquecida com o saque da Quarta Cruzada em 1204, mas esta é uma história já contada em minha visita à Catedral de São Marcos, em Veneza, há 3 anos atrás) e se torna o primeiro Patriarca da Igreja Ortodoxa Sérvia.

Retorna à Servia em 1219 e se dedica a construir a estrutura administrativa de seu patriarcado. Cria 11 arcebispados no interior do país em locais de importância geopolítica e nesse mesmo ano, publica a primeira Constituição do país, possibilitando ao mesmo tempo a independência política e religiosa da nação e criando o verdadeiro caráter da Sérvia.

Dedica-se nos anos futuros até sua morte ao trabalho diplomático, visitando patriarcados em muitos países e aos ensinamentos religiosos. Morre aos 66 anos, em 1236 no Mosteiro de Tarnovo na Bulgária e é sepultado na Igreja dos Santos Quarenta Mártires. Um ano depois seu corpo é transferido para o Monastério de Mileseva, na cidade de Prijepolje, no sudoeste da Sérvia com honras de estado e pompas religiosas.
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Monastério de Mileseva
 Foi canonizado como São Sava e seu culto atravessou os séculos. Em 1594, no levante de Banat contra os Otomanos, os sérvios levavam a imagem de São Sava em suas bandeiras. Em retaliação, os Otomanos queimaram as relíquias do santo em Vracar, o ponto mais alto de Belgrado.

Este local foi escolhido em 1943 para ser construído o segundo maior templo ortodoxo do mundo: a Basílica de São Sava, com 8 mil metros quadrados de superfície. Devido a sua privilegiada posição ele pode ser avistado de qualquer ponto de Belgrado.

Cruz no topo da Basílica de São Sava, em Belgrado

Andjelka convidou Martin, um jovem arquiteto que trabalha na construção da igreja para nós guiar na visita ao templo, em nossa segunda manhã em Belgrado quando não tínhamos a menor noção da história da Sérvia e da importância de São Sava na construção da unidade e do caráter nacional da Sérvia.

Grande sacada! Como funcionário, Martin (leia-se nós) tinha acesso a lugares proibidos da obra. A melhor delas, com certeza, é o topo, uma passarela a 7,5 metros do solo, próxima à cruz da cúpula, que permite visão de 360º de toda a Belgrado. 

Beatriz, Andjelka e Edna na passarela ao redor da cúpula do Templ de São sava - Belgrado
Acesso por degraus inconclusos, sem corrimão e pouca luz. Mas a visão valeu a pena!!!
Martin nos contou que nos tempos de Tito a construção ficou parada; apenas a paredes, sem teto. O projeto foi escondido e ninguém sabia como continuar. 

Com a dissolução da Iugoslávia e a perda do poder central da Sérvia, era importante politicamente construir algo majestoso, que reafirmasse a supremacia sérvia. Retomar o Templo de São Sava era perfeito para mostrar ao mundo a grandeza da Sérvia.Os recursos para a construção vêem do Estado, a quem interessa a finalização do templo..

Nos últimos 20 anos eles conseguiram subir as paredes e cuidar do teto, um intrincado sistema de cúpulas (ou eu as percebi assim). 


Interior do templo, ainda em construção
Todo o mais ainda está no cimento bruto, à exceção da Cripta -  essa em fase final de decoração. Decoração em estilo bizantino, coma pintura de vários santos da Igreja Ortodoxa Sérvia nas paredes. 


Martin, Edna e Beatriz visitando as obras da Cripta.
Foi muito interessante para mim observar em detalhes e - com tempo - a fase final de decoração de um templo: a coordenação entre os pintores. Como há regras claras para a pintura bizantina, mesmo que muitos artistas trabalhem nos painéis, o resultado final é homogêneo. 


São Sava ao centro, abençoando Edna e Beatriz
Para nós, de cultura cristã romana, é um grande privilégio ter acesso a tal estilo de arte. Estamos familiarizados com a reprodução de Santos, Anjos, Cristos e Virgens em estátuas dos mais variados estilos e épocas e materiais: ouro, madeira, mármore e - atualmente, de gesso e resina, Na cultura ortodoxa, há apenas ícones e pinturas. E a uniformidade das regras deixa confuso os desatentos> Cuidado para orar ao santo certo!


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