terça-feira, 19 de abril de 2016

12.27 - Bálcãs. Os Janissários

Desde a minha viagem à Turquia há 2 anos atrás queria comentar este assunto: a guarda de elite do Imério Otomano e a guarda pessoal do sultão: os Janissários.
Essa corporação foi criada pelo Sultão Murad I em 1383, a partir do recrutamento obrigatório de todo primeiro filho homem de cada família cristã, nos territórios ocupados pelo Império Otomano. Antes, o exercito era composto por soldados recrutados a partir das tribos turcomanas que constituíam o império. Esses soldados prestavam lealdade muito mais aos chefes de seus clãs que ao próprio sultão, criando uma situação de instabilidade militar. Foi a partir dessa constatação que Murad I concebe uma guarda especial, a partir de soldados não turcos. Esses garotos cooptados a partir da idade de 9 a 14 anos, desde a Bulgária, Servia, Croácia, Eslovênia.....eram primeiro encaminhados à casas de famílias turcas, como escravos, onde aprendiam o idioma e costumes muçulmanos.

Após esse período de adaptação, eram encaminhados à Istambul, para educação militar. As características dessa educação permitiu formar uma tropa de elite muito bem preparada e coesa que permitiu a expansão do Império Otomano pelos dois séculos seguintes. Os garotos, agora convertidos ao Islã, tinham como primeira regra a irrestrita devoção religiosa e a lealdade ao Sultão. Eram proibidos de se casar e formar família e de participar de acontecimentos na sociedade civil. Eram restritos à vida militar. Com isto, a única rede sócio-afetiva eram os colegas de corporação. Não tinham casas e viviam em barracas, com o mínimo de conforto e de bens pessoais. Com essas regras e rígida disciplina militar, foi possível construir uma sólida e eficiente corporação militar com os melhores treinados soldados da época.

Em 1575, 200 anos depois de sua criação, haviam 20 mil janissários. Esse número continuou a crescer até chegar a 50 mil ao final do século e depois de algumas variações, chegou a 135 mil em 1826. A eficiência  e fama dessa corporação era tanta, Europa a dentro, que Mozart compôs a Marcha dos Janissários. Claro, com tanta gente envolvida e tanto eficiência, a hierarquia da corporação começou a aumentar seu poder político, o que permitiu a quebra das regras disciplinares. Primeiro, começaram a ser aceitos soldados de origem muçulmana e depois, os chefes militares se envolveram em atividades comerciais, criando fortunas e poderosos laços com a sociedade civil. As portas da corrupção estavam abertas, as conspirações também.... a eficiência militar e a lealdade ao sultão foram postas à prova. Tornaram-se forças políticas conservadoras e opositoras às reformas necessárias à modernização do estado otomano.


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Gravura de Batalhão de Janissários do sec XIV.
Em 1826, durante o reinado de Mahmud II houve uma revolta dos Janissários: o Incidente Auspicioso. Numa demosntração de força, o sultão agiu rápido, dissolvendo os centenários batalhões, prendendo seus lideres; Cerca de 6 mil militares foram presos,  muitos foram assassinados e outros exilados, findando assim um ciclo militar de 3 séculos.


Gravura mostrando Janissários como guarda-costas do sultão, na Corte Otomana
Na Sérvia ouvi  o outro lado da história: o das famílias que tinham seus filhos requisitados pelo sultão. Quase 150 anos depois do fim dos Janissários, o inconsciente coletivo ou o lamento coletivo continua. Ouvi relato de famílias que amputavam mãos ou pés de seus filhos para torná-los incapazes aos olhos dos turcos.

Em todas as culturas, em todas as histórias da civilização sempre há a história do conquistador e do dominado. Sempre há as duas versões. Conhecê-las de modo amplo, multifacetado, dá um significado especial as minhas viagens.

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